Comércio global de alimentos face à Covid-19 é o destaque da Série Diálogos Estratégicos da Embrapa
O comércio global de alimentos é um dos setores estratégicos que deverá continuar operando normalmente nos próximos meses, apesar dos efeitos da pandemia da Covid-19 e seus desdobramentos como o bloqueio temporário de alguns portos e rodovias, isolamento social e até mesmo lockdown. A expectativa para as safras 2020/2021 são positivas em todo o mundo, mesmo sob o risco de medidas protecionistas que podem ocorrer em alguns países, como por exemplo a estocagem de alimentos. As informações integram a série Diálogos Estratégicos, edição de maio, publicada pela Secretaria de Inteligência e Relações Estratégicas da Embrapa e disponível para download a partir do Sistema Agropensa.
Ao todo, cinco fascículos apresentam o cenário para o agronegócio mundial que vem se desenhando a partir da Covid-19 que se espalhou para o mundo, com ênfase nas perspectivas a partir da economia chinesa.
O tema também foi apresentado pelo autor do estudo, pesquisador Mário Alves Seixas, na Série de Palestras Técnicas online organizada semanalmente pela Embrapa Arroz e Feijão, em parceria com a Embrapa Florestas. A palestra “Agronegócio em tempos de Covid-19: desafios para o Brasil e a China”, foi transmitida na terça-feira (23) para um público formado por participantes externos e internos, entre especialistas de universidades e institutos federais de educação, representantes de Câmaras Setoriais e Temáticas do Ministério da Agricultura, pesquisadores, analistas e chefes de unidades descentralizadas da Embrapa, como Elcio Guimarães, da Embrapa Arroz e Feijão, e Liv Soares Severino, da Embrapa Algodão.
Autor do estudo, o pesquisador Mário Alves Seixas aponta possíveis riscos e desafios que deverão ser enfrentados pelos governos mundiais. Entre eles a dificuldade para escoar a produção por parte de alguns países como Argentina, Brasil e EUA, devido ao fechamento de fronteiras ou restrições de movimentos; procedimentos portuários podem levar mais tempo para serem realizados em razão de medidas de saúde e segurança adotadas, disponibilidade de trabalhadores; diversificação geográfica da China que começa a acelerar.
O país asiático também estuda intensificar a produção agrícola para consumo interno, porém, a partir de outros países, na modalidade “produzido no exterior para a China”. Além disso, o governo chinês deverá criar mecanismos para incentivar a compra de grãos dos Estados Unidos, como forma de honrar o compromisso assumido a partir do novo acordo comercial EUA – China.
Dados da Série Diálogos Estratégicos apontam, ainda, que o volume de importação pela China de grãos de soja dos EUA tem o potencial de atingir mais de 40 milhões de toneladas por ano, a partirde 2020. Em relação ao milho e trigo, o governo chinês declarou que não haverá alterações no atual sistema de cotas de importação. Mas estima-se que incremente, consideravelmente, as aquisições de milho e trigo dos EUA, em detrimento de outros parceiros internacionais como Ucrânia (milho), Canadá e Austrália (trigo). Em relação ao setor de carnes, a China também deverá incrementar as importações de carnes suína, bovina e de aves dos EUA.
“A forte demanda da China por importações de carne suína continuará em 2020, por causa da Covid-19 e da endemia da PSA. Estima-se que os requisitos de importação de carne suína da China aumentem entre30% e 40%, em 2020 e 2021, em relação aos níveis de 2019. Isso sugere que haverá pressão significativa no lado da oferta global. Em relação à carne bovina, entretanto, estima-se que haja um crescimento dos embarques de carne bovina dos EUA para a China, em 2020, em detrimento de outros países exportadores, inclusive o Brasil”, detalha Seixas no estudo.
Tendências mundiais para 2020 face à pandemia da Covid-19
Estimativas anteriores ao surto da Covid-19 indicavam que o crescimento do Produto Interno Bruto mundial seria de 2,9%. No entanto, com a disseminação do novo coronavírus pelo mundo, em diferentes graus, as estimativas das agências internacionais de risco são por uma profunda contração, chegando a reduzir 2.5%, um resultado bem pior do que o de 2008, quando registrou-se a crise financeira global.
“O efeito negativo sobre o crescimento ocorrerá tanto pelos canais de demanda quanto de oferta. Medidas de quarentena, doenças e sentimentos negativos de consumidores afetarão drasticamente a demanda. Ao mesmo tempo, o fechamento de indústrias agroalimentares e a interrupção das cadeias de suprimentos criarão gargalos no fornecimento. Estima-se, contudo, que o choque econômico estará concentrado, principalmente, no primeiro semestre de 2020, com variações regionais que seguem a disseminaçãogradual da pandemia pelo mundo”, detalha o pesquisador da Sire.
De acordo com o estudo, as agências internacionais, contudo, preveem uma modesta recuperação na produção global, no segundo semestre de 2020, desde que a disseminação da Covid-19 seja amplamente contida globalmente e que não ocorra uma segunda ou terceira onda da pandemia. Por outro lado, o aumento das incertezas permanecerão, com consumidores se mantendo em quarentena, com o medo de contrair a Covid-19, o que manterá o mercado interno desaquecido.
Para os países do Brics, são estimadas taxas de crescimento negativas do PIB, para este segundo trimestre: Brasil (-11%), Índia (-9,3%), Rússia (-10,5%), África do Sul (-7,5%). A China, que no primeiro trimestre registrou um PIB negativo de -10,2, a partir deste trimestre (abril/junho) já dá sinais de recuperação com um PIB em recuperação estimados em 9,2% positivos, para o segundo trimestre.
Impactos nas cadeias produtivas brasileiras
A produção de soja brasileira 2019/2020 está estimada e 124 milhões de toneladas, 8% acima da produção registrada em 2018/2019. A área plantada deverá ser de 36,5 milhões de hectares, um aumento de 1,7% em relação ao período anterior. “No entanto, esse incremento representa uma taxa de desaceleração da expansão dada a incerteza em torno da evolução do mercado em 2020 e o acordado nas negociações comerciais EUA-China e maior disseminação da peste suína africana”, ressalta Mário Seixas.
O pesquisador explica que o surto de PSA que o país vem enfrentando desde o ano passado, dizimou uma parte significativa do rebanho de suínos. E, embora o país encontre-se numa fase de reaquecimento da produção, o consumo animal de soja ainda é pequeno, face a escassez do rebanho.
Por outro lado, o milho continuará em expansão, com um incremento de 5% na sua área de cultivo, com a expectativa de uma safra de 99 milhões de toneladas e metade da safra terá como destino o mercado internacional.
No setor de proteína animal, a produção brasileira continuará evoluindo positivamente. Estima-se que a produção de carne aumente 5,9%, a de suínos 4,5% e a de aves, 2,5%. “A produção de carnes bovina, suína e de aves vai acelerar até 2024 impulsionada pela demanda de mercados externos, desvalorização do real que estimulam as exportações, bem como pelos custos da produção brasileira serem bem competitivos”, diz Seixas.
No entanto, Seixas alerta que um dos fatores de risco é a pandemia de Covid-19, no próprio território brasileiro. “Alguns matadouros de carne bovina já estão reduzindo as operações, principalmente por causa das incertezas em relação à demanda doméstica no curto prazo. A obtenção de acesso ao mercado da Indonésia, bem como ao dos EUA, representa boas oportunidades para as exportações brasileiras”, explica.
Saiba mais sobre os reflexos da Covid-19 no agronegócio brasileiro acessando a série Diálogos Estratégicos do mês de maio.
Reflexos da eclosão da Covid-19 no agronegócio no Brasil
Reflexos da eclosão da Covid-19 no agronegócio Chinês
A eclosão da Covid-19 e seus reflexos na economia mundial
Agronegócio em tempos de Covid-19: desafios para o Brasil e a China
Publicado em: Agro&Negócios